domingo, 1 de agosto de 2010

TEXTOS DISCUTÍVEIS – 18

- Pedagogia -

Retirado de: http://pedrodemo.sites.uol.com.br/textos/td18.html

Em 01.08.10


 

Pedro Demo (2010)


 


 

Em homenagem aos pedagogos, faço aqui uma defesa da pedagogia. É um dos cursos mais decadentes hoje, mas é o mais importante. Assim como não faz sentido assegurar que educação é fundamental para a economia e a melhoria salarial, e manter o professor ganhando muito mal, também não faz sentido apregoar os desafios da sociedade intensiva de conhecimento e manter seu protagonista maior – o professor – marginalizado. Embora desenvolvimento seja naturalmente processo de longo prazo, o investimento no professor, em especial no pedagogo, é o caminho mais promissor e mais curto. O aluno aprende à imagem e semelhança do professor, tanto assim que, quando avaliamos o aluno, acabamos avaliando, impreterivelmente, também o professor. O pedagogo não é "culpado" – a acusação de culpa é má consciência por não cuidarmos dele minimamente – é apenas vítima do sistema educacional que, em sua eterna hipocrisia, prega uma coisa e faz outra, de preferência contrária e contraditória (Buarque, 2008). Educação é sempre "prioridade", menos pedagogia e os pedagogos. Podemos criticar como quisermos – certamente muitas críticas são adequadas – mas não escapamos de valorizar esta profissão tão estratégica e indispensável (Demo, 2007).


 


 

  1. FIGURA ESTRATÉGICA


 


 

O ponto de partida mais recomendável seria, certamente, a sociedade da qual o pedagogo faz parte: sociedade que se diz intensiva de conhecimento (Duderstadt, 2003). Todas as sociedades humanas são sociedades do conhecimento, porque conhecimento é marca preponderante. Mas esta era é dita "intensiva" de conhecimento, porque, mais que outras, conhecimento contamina todas as suas dobras. Por extensão, diz-se também sociedade da aprendizagem, porque se tornou patente que aprendizagem é processo que dura a vida toda, cuja identidade só permanece, se mudar. Vamos nos desconstruindo e reconstruindo processualmente, porque, neste sentido, vida e aprendizagem são sinônimos. Uma das características esplendorosas da vida é a construção da autonomia, sendo que uma das rotas mais fundamentais desta construção é saber aprender (Capra, 2002). Disto já se depreende que aprender não pode ser gesto reprodutivo: a matéria se fez vida, porque sabe aprender... Na sociedade intensiva de conhecimento e aprendizagem, professor, em particular o pedagogo, assume a condição de exemplo primordial.

Primeiro, é o profissional da aprendizagem (Darling-Hammond & Sykes, 1999). Faz da aprendizagem sua profissão e por isso carece apresentar-se como aprendiz contumaz. Aprende a vida toda, permanece estudando, pesquisando e elaborando. Segundo, é o profissional do conhecimento, não necessariamente porque produz resultados sofisticados metodologicamente falando, mas porque sabe fazer do conhecimento rota formativa no aluno. Terceiro, é o profissional da autoria: dá aula porque é autor. Não se define pela aula, mas pela capacidade de produzir conhecimento com qualidade formal e política. Seu horizonte mais básico está voltado à preparação para a vida, como se imagina nos primeiros degraus da educação básica (principalmente educação infantil e ensino fundamental). Mas guarda importância decisiva também como iniciação ao mercado, porque o mercado de hoje – globalizado e competitivo – exige trabalhadores que sabem pensar, aprender, pesquisar, elaborar. Já não basta contar "anos de estudo", como fazem as estatísticas. É imprescindível que tais anos tenham sido e sejam sempre de aprendizagem. De fato, aluno aprende bem com professor que aprende bem (Demo, 2008). Por todas essas prerrogativas, o pedagogo aparece na cena como figura estratégica. Entende-se por figura estratégica aquela que define as propriedades e desafios, expressa presença iniludível, saber lidar com recursos e propostas, ou seja, é decisiva.

Esta figura estratégica ganhou contornos tanto mais apropriados, através de propostas críticas, cujos patronos são formidáveis como Escola de Frankfurt, Freire, Gramsci, Saviani, Brecht, além de Sócrates (o pai dos pedagogos) (Darder et alii, 2009). Postula-se que educar requer espírito crítico, para não decair facilmente em domesticação. Segundo Freire (1997), educar é saber influenciar o aluno de tal modo que não se deixe influenciar. Falava de um tipo de "autoridade" que não sufoca e oprime, apontando sempre para a "pedagogia do oprimido" (2006): enquanto o oprimido esperar do opressor a libertação, não tem chance. Carece gerar espírito crítico para dar-se conta de sua condição de massa de manobra, bem como de produzir proposta alternativa própria, para não depender dos algozes. As pedagogias críticas nem sempre são coerentes (em geral são monolíticas, respondendo a um erro com o erro oposto) (Demo, 2010), pois fogem da autocrítica e de serem criticadas. Mas são visões insubstituíveis para se poder trabalhar a emancipação popular (Saviani, 2005. Demo, 2004).

Pedagogia é o curso mais importante da universidade porque define a razão maior de todos os cursos: aprender. Em consequência, defende-se que todo professor deveria deter algum fundamento pedagógico, para poder lidar melhor com a aprendizagem dos alunos. Muitas vezes, confunde-se esta preparação com "saber ensinar" ou "dar aula", por conta da herança rançosa instrucionista. Todos os cursos deveriam poder mirar a pedagogia para contemplar o exemplo consumado de aprendizagem adequada: professores autores, foco no aluno, estilos participativos, reconstrutivos, maiêuticos, nos quais aula é detalhe sempre secundário, se tanto. Na pedagogia se armam ambientes adequados, atualizados, abertos de aprendizagem e que servem de inspiração para todos os outros cursos. Na pedagogia, igualmente, se sabe avaliar a aprendizagem, em especial em sua dinâmica qualitativa, bem como orientar, evitando-se a postura autoritária docente.


 


 

  1. MAZELAS DA PEDAGOGIA


 


 

São muitas as mazelas, porque o curso ainda é decadente. Foi arrastado a propostas sumárias por volta de dois anos e meio de duração, agravando a imagem negativa de curso desvalorizado. Pedagogia, frequentemente, é última opção. É primeira opção para se inventar um curso pouco exigente e fácil de manejar, em especial em ambientes mercantilistas. Entre as mazelas da pedagogia podemos citar:

  1. Fundamentação científica e metodológica precária, mantendo-se estilo normativo de discurso, por vezes piegas; embora se usem teorias emprestadas das ciências sociais e algumas naturais (biologia, por exemplo), não se acolhe o rigor científico previsto, mostrando-se sobretudo no campo metodológico a imperícia na pesquisa; inventou-se a "pesquisa qualitativa" em parte para facilitar a vida de pedagogos que não dão conta de estatística e lógica abstrata (Demo, 2001; 2004), o que também não resolveu muita coisa, precisamente por falta de qualidade metodológica; a crítica ao positivismo foi importante e marcou o espaço de atuação, mas os resultados se mantiveram preliminares;

  2. Estigmatização do curso como facilitado, encurtado e pouco promissor em termos de mercado (professor de escola pública); em geral não dura três anos, enquanto deveria ser um curso de cinco anos, dada sua importância, complexidade e necessidade de atualização; persiste o estereótipo: pedagogia é curso para quem não quer estudar muito, principalmente matemática;
  3. Desatualização generalizada do curso; primeiro, desatualização em termos propriamente pedagógicos, porque está mergulhado no instrucionismo – nele se dão aulas e se aprende, na prática, a dar aula; não se toma conhecimento das teorias mais modernas e pós-modernas de aprendizagem (Demo, 2002), mantendo-se procedimentos medievais de transmissão copiada de conteúdos, cuja função é ser copiada pelos alunos; segundo, desatualização tecnológica, quando não forte resistência (Stoll, 2009. Siegel, 2008), às novas tecnologias, postando-se fora do mundo contemporâneo, em especial frente às novas gerações;
  4. Falta de autoria docente e discente, do que segue dar aula sem autoria com a maior tranquilidade, sem se aperceber que é plágio; à revelia de discursos críticos e transformadores (por conta da pedagogia da transformação de inspiração freireana), a pedagogia preserva o olhar voltado para trás, permanecendo destituída da habilidade de produção de conhecimento e da habilidade de formar estudantes produzindo conhecimento; desconhecem-se os movimentos (em geral virtuais) de promoção da autoria, nos quais todos participam produzindo textos próprios, por mais simples que possam ser (wikis, blogs, etc.);

  5. Baixíssima autoestima e falta de controle da profissão colocam o exercício profissional à deriva, sem rumo, decadente; a predominância maciça do sexo feminino indica também que se trata de profissão relegada a segundo plano, no contexto dos privilégios patriarcais: ficam para a mulher funções menos nobres, em particular cuidar de crianças, permitindo, ainda, que se paguem remunerações aviltadas; em todo lugar em que se pagam salários adequados a presença masculina cresce "naturalmente"; por falta de uma "Ordem dos Pedagogos do Brasil", a profissão é devassada por todo mundo que se mete a "professor" e comparece como refúgio fácil de gente mal preparada e que não gosta de estudar (Demo, 2008a).

O que mais preocupa no pedagogo são a carapuça de desatualizado e o desconcerto entre discurso e prática. Duas discussões se põem neste horizonte. Na primeira, preocupa o pedagogo desatualizado porque não sabe discutir com autonomia e autoria os desafios propostos pelas novas tecnologias e pelos novos tempos. A função essencial de manter o "olhar do educador" com respeito às tecnologias, em sentido crítico, não aparece porque o pedagogo está "por fora". A segunda, refere-se à falta de prática tecnológica: enquanto a geração net comparece adornada de todos os badulaques imagináveis, o pedagogo é bem capaz de aparecer nu, ou apenas com um celular fajuto. O discurso da transformação social perde-se no vazio, já que a aprendizagem escolar continua precaríssima.


 


 

  1. INCLUSÃO DIGITAL


 


 

A centralidade da pedagogia surge de outra temática contemporânea da maior relevância: inclusão digital. Levando-se em conta a importância das novas alfabetizações, bem com das habilidades do século XXI, saber lidar com computador/internet, manejar informação e conhecimento, exercitar autoria individual e coletiva em ambientes virtuais, aprimorar o espírito crítico e científico, dificilmente se escapa de reconhecer que a inclusão digital mais promissora é pela via da aprendizagem escolar (Demo, 2009). Tradicionalmente, a inclusão digital se escuda em outra concepção considerada inepta, como instalar um laboratório de informática em cada
escola, distribuir computadores na escola, promover cursos (sobretudo "cursinhos") de digitalização ou coisa parecida, fazer campanhas eventuais, etc. A razão por que tais propostas não "pegam", é porque não fazem parte do processo de aprender. Primeiro, é preciso conquistar o pedagogo, no sentido de que se torne tecnologicamente correto, ou seja, insira em sua estruturação da aprendizagem ambientes virtuais como naturais e normais. Neles exercita sua autoria, pesquisa e elabora, argumenta e contra-argumenta. Nele ensaia propostas colaborativas e interativas. Na escola, a introdução de ambientes virtuais de aprendizagem dotados de devida qualidade (feitos para se aprender bem, como oportunidade nova e inovadora) depende, acima de tudo, dos pedagogos. Sua participação é essencial também porque necessitamos impreterivelmente de espírito crítico frente às novas tecnologias, ou, o "olhar do educador", que nem pratica "tecnofilia", nem "tecnofobia". A qualidade educativa possível nas novas tecnologias é coisa de pedagogo. Segundo, trata-se de introduzir o aluno em ambientes virtuais de aprendizagem, o que, em geral, não impõe grandes problemas, já que a nova geração se dá bem com computador e internet. Existem muitas ideias na praça, com realce para o programa "um computador por aluno" (UCA) (Zittrain, 2008), porque se imagina como oportunidade renovada de alfabetização já encaixada em ambientes virtuais. Entretanto, um programa como esse só poderia ser levado adiante, se os pedagogos o abraçassem sem temor e com espírito crítico, combinando duas vertentes nem sempre confluentes: acompanhar os avanços incansáveis das novas tecnologias (muitas vezes excessivos e mercadológicos), e garantir a razão maior de ser delas, que é aprendizagem tanto mais pertinente.

Entrando pela via da aprendizagem, em especial das novas alfabetizações na escola, a inclusão digital ganha outro horizonte. Sai da condição de eventos esparsos e diletantes, para a de estruturação para a vida toda. Computador e internet, para além de inúmeras outras funções e chances, passam a parte integrante da maneira de aprender e de lidar com conhecimento. Fica para a vida. De fato, a inclusão digital está cada vez mais próxima da inclusão social, porque, em certo sentido, a inclusão digital condiciona as outras. Participar na sociedade intensiva de conhecimento e aprendizagem implica manejo eletrônico, considerado "alfabetização" também, como instrumentação ubíqua. Não é mais optativo. É avassalador. Entretanto, para tomar rumos favoráveis aos interesses da sociedade (não do mercado apenas), é indispensável a presença do pedagogo, de quem se espera que, sabendo lidar com tecnologia, imprima a ela significações pertinentes em termos de qualidade e igualdade de oportunidades.


 


 

ENFIM


 


 

Precisamos, na rapidez possível, reconstruir o futuro da pedagogia. Implica corte profundo frente às pedagogias atuais, flagrantemente instrucionistas, resistentes e estáticas. Precisamos colocar pedagogia na frente dos tempos, para que os tempos ganhem rumo. Precisamos criar uma pedagogia que seja o troféu da nova geração em termos das oportunidades de aprender bem. É situação esdrúxula, incômoda. De um lado, constata-se ostensivamente que se trata de um dos cursos mais aviltados e decadentes. A imagem comum é que pedagogia faz quem não conseguiu melhor chance (com exceção dos vocacionados). De outro, não é difícil desenhar sua importância estratégica para o desafio do desenvolvimento desta sociedade intensiva de conhecimento e aprendizagem. É o curso mais importante. É o curso dos cursos, porque define o que é, e como, aprender. Ao mesmo tempo, seria de se esperar que os pedagogos cuidem da pedagogia, impedindo que se torne "saco de pancadas" e butim de aventureiros. Como curso, deveria durar no mínimo quatro anos e rivalizar frontalmente com os melhores da universidade.


 


 

BIBLIOGRAFIA


 


 

BUARQUE, C. 2008. O que é Educacionismo. Brasiliense, São Paulo.

CAPRA, F. 2002. As Conexões Ocultas - Ciência para uma vida sustentável. Cultrix, São Paulo.

DARDER, A., BALTODANO, M.P., TORRES, R.D. (Eds.). 2009. The Critical Pedagogy Reader. Routledge, London.

DARLING-HAMMOND, L. & SYKES, G. (Eds.). 1999. Teaching as the Learning Profession - Handbook of policy and practice. Jossey-Bass, London.

DEMO, P. 2001. Pesquisa e Informação Qualitativa. Papirus, Campinas.

DEMO, P. 2002. Complexidade e Aprendizagem – A dinâmica não linear do conhecimento. Atlas, São Paulo.

DEMO, P. 2004. Pesquisa Participante – Saber pensar e intervir juntos. LiberLivro, Brasília.

DEMO, P. 2007. Aposta no Professor - Cuidar de viver e de trabalhar com dignidade. Editora Mediação, Porto Alegre.

DEMO, P. 2008. Aprender Bem/Mal. Autores Associados, Campinas.

DEMO, P. 2008a. Metodologia para quem quer aprender. Atlas, São Paulo.

DEMO, P. 2009. Educação Hoje – "Novas" tecnologias, pressões e oportunidades. Atlas, São Paulo.

DEMO, P. 2010. Saber Pensar é Quesitonar. LiberLivro, Campinas.

DUDERSTADT, James J. 2003. A University for the 21st Century. The University of Michigan Press, Ann Arbor.

FREIRE, P. 1997. Pedagogia da Autonomia – Saberes necessários à prática educativa. Paz e Terra, Rio de Janeiro.

FREIRE, P. 2006. Pedagogia do Oprimido. Paz e Terra, Rio de Janeiro.

SAVIANI, D. 2005. Pedagogia Histórico-Crítica. Autores Associados, Campinas.

SIEGEL, L. 2008. Against the Machine - How the web is reshaping culture and commerce - and why it matters. Spiegel & Grau, New York.

STOLL, C. 1999. High Tech Heretic – Why computers don't belong in the classroom and other reflections by a computer contrarian. Doubleday, New York.

ZITTRAIN, J. 2008. The Future of the Internet – And how to stop it. Yale University Press.


 

quinta-feira, 15 de julho de 2010

PENSAÇÕES SEM PÉ NEM CABEÇA III – Por que não sei o que deveria saber?


 

POR Heitor Rocha Gomes

De repente eu comecei a entender. Deixei de ser engraçado em certos lugares, com certas pessoas. Ao mesmo tempo que me descubro limitado e impotente diante do meu fazer percebo que é ai que está meu tesouro e minha força. Quando descubro o que me falta, quando sinto minha incompletude saio do conforto, da normalidade, da inércia construída pelas certezas calcadas nas especulações superficiais sobre o outro. De repente me encontrei perdido no meio de tantas vozes reconfortantes que diziam é assim mesmo, as coisas sempre foram assim...os professores são aqueles que cumprem os comandos, os pedagogos são aqueles que ajeitam as coisas, os técnicos da internos da SEDUC são aqueles que cuidam de remendar os rasgos históricos deixados pela negligência de uma política educacional perversa e antiquada. Os governos vão passando e cada um conduz o barco da educação conforme lhe apraz, conforme os ventos políticos partidários que lhes sopram as narinas. E nós os remadores vamos nos adequando conforme os toques e os ritmos que nos são impostos...existem aqueles que acham que os comandantes passam e que sobram apenas os marinheiros, que tolos é que são...essa constante troca de comandantes acaba por criar uma permanência de comando e uma permanência de comandados, um continuo recomeço de história.

    Mas por que iniciei essa conversa? Porque cada vez que vejo uma criança analfabeta, faminta, violentada e sem perspectiva...vejo nela meu filho lindo, cada vez que vejo os olhos de criança ou adolescente na escola vejo os olhos grandes do meu filho...eu me vejo. Cada vez que vejo uma professora desesperada com os cabelos em pé, impotente diante de uma criança que chora, que grita, que rasga, que esmurra, que xinga e que não lê me solidarizo com ela e com a criança. Mas a minha solidariedade não aplaca a dor de quem não consegue nem de quem não consegue ensinar...iniciei essa conversa por conta disso: não vou descansar minhas armas enquanto essa realidade não der sinal de mudanças. Estou falando de mudanças e não de arremedos, de fingimento, de superficialidades...eu quero tudo que é direito. Em nossa casa estamos educando nosso filho para ser um rei solidário, fraterno, digno sábio, espirituoso, criativo, mas, estamos o educando para ser REI. Não queremos menos. Nós o educamos com o nosso suor, com ausência, as vezes...mas também com nossa firme presença mesmo nas ausências. Por que vou querer menos para o filho do outro. Isso é sacanagem, é perversidade, mesmo que ingênua as vezes.

Comecei essa conversa por que parece que eu me ausente do meu lugar de pedagogo e me refugie no conforto da mediocridade e da informalidade do achar isso e achar aquilo. Que eu aceite que a falta de cuidado com a educação é histórica e que não tem jeito, que as coisas vão se ajeitando devagar. Enquanto isso aceitamos normalmente 26 crianças entre 09 e 10 anos não saibam ler e interpretar um texto simples. Que adolescentes de 12, 13 e 14 não saibam construir um pequeno texto com coerência e coesão básica...que passem para a quinta série, onde será tratado sem a menor especificidade, onde será mais um, sem a mínima preparação para essa nova fase.

Comecei essa conversa porque uma menininha de 07 anos falou coisas tão terríveis para uma criança de sua idade que não vou ousar reproduzir neste dialogo para não ampliar a energia negativa daquele momento. Como pode uma criança parecer tão cruel? Como ela pôde falar daquela forma, como pôde me xingar daquele jeito, por que estava tão furiosa agredindo todos que passavam? Por que estava fora da sala, por que sua professora a deixou fora da sala, por que ela vai para casa sozinha desde seus cinco anos, por que ela é que leva e traz seu irmão, por que ela não conhece as letras mesmo vindo da educação infantil, por que sua fúria arrefece quando precisa pegar o leite e a merenda, por que sua é ausente, por que, as vezes, chega sua na escola, onde aprendeu xingar? Por que eu não soube o que fazer? Pensei em denunciar a mãe a Conselho Tutelar...pensei tantas coisas. O fato a situação da menina não é a única, após a denuncia do conselho precisa-se de acompanhamento familiar, precisa-se de suporte da Assistência Social, precisa-se garantir segurança, continuidade serviço até que o risco cesse. Mas aí as demais políticas funcionam como a educação fazendo o que dá, improvisando, Conselho Tutelar visitas as famílias quando dá, a Assistência Social tem um Programa denominado CRAS que não cumpre a função para o qual foi criado, a saúde é ausente...no final da história é uma grande brincadeira de mal gosto.

Comecei essa conversa para registrar, grafar minha indignação, e nesse momento não me interessam as formalidades estéreis,a tecnicidade descompromissada, o compromisso distante daqueles que querem organizar a dor dos outros sem empatia...bancando os salvadores inorgânicos. Não assumi a educação para ser simpático com educandos, educadores, pais, comunidade, diretores, técnicos, secretários, diretores...nem também para ser antipático. Eu assumi ser educador para transformar com o outro, para fazer a diferença...não tenho interesse de ser mais a fazer qualquer coisa...para o inferno com a mesmice confortável que produz escravos revoltados que matam si mesmos e outros em igual situação de escravidão sejam eles educadores o educados.

Comecei essa conversa para reafirmar que sei quem sou, por que estou sempre a me reconhecer no olhar do outro que me olha. Descobrindo de onde vim, construindo onde estou e projetando para onde vou... sei que não estive sozinho, sei que não estou sozinho, sei que não estarei sozinho... há os solidários.


 

Alagoinhas – BA 15 de julho de 2010

terça-feira, 22 de junho de 2010


 

GENTIL CRIS


 

Há outro mundo em construção, há novos construtores, há novas formas de construir...houve o tempo de tramar as escuras, nas cavernas, nas tavernas, no mato, no medo...houve o tempo das garras, das presas, das lanças, das facas, espingardas, canhões...houve o tempo da careta, da cara feia e sisuda, da força bruta, dos mártires... sei que não vivemos o tempo do contrário ainda precisamos de muitas das estratégias de outrora mas para além destas precisamos de mais pessoas que saibam brigar, lutar, ensinar e aprender, conflitar, argumentar...ASSIM DO SEU JEITO...PODE CRER A TUA PASSAGEM MARCOU E IRÁ ECOAR POR MUITO TEMPO NOS QUE TIVERAM A OPORTUNIDADE DE CONVIVER COM VOCÊ...É A MINHA LEITURA.


 

COM GENTILEZA,


 

HEITOR ROCHA GOMES

terça-feira, 15 de junho de 2010

DISCURSO



Discurso

Inspirado numa conversa com um graduando do sétimo semestre de pedagogia


Por Heitor Rocha Gomes

Atualmente ando meio intrigado com os discursos, sejam os meus discursos os de outrem. Estou aprendendo que as coisas só passam a existir quando aprendemos a nomeá-las, a significá-las, quando as devoramos fisicamente ou simbolicamente. E é por isso que ando intrigado com os discursos...se eles nomeiam as coisas, atribuem sentido, significado, produzem realidades...pergunto: o que estou comunicando ao mundo e sobre o mundo. As vezes sinto-me navegando na superficialidade das coisas vividas meio que sem rumo...as vezes me parece que minha voz, minha fala não é minha, que ambas são apenas ecos de outros que jazem no passado... parece que meus discursos diferem de mim, me contradizem, caçoam do que de fato sou(?) e sinto.
Estamos nós pedagogos dizendo acreditar que a educação vale a pena, que ela é um direito inalienável...imprescindível...falamos de sujeitos cognocentes, de sócio-interação, de ludicidade, leitura e escrita de ambiente isso e ambiente aquilo... e cada vez eu penso: não sei. Aí para sustentar o insustentável eu cogito: será que preciso ler mais? Será que há explicação para esse caos eu estou vivendo...é possível de fato encontrar um principio organizativo no caos educacional que percebo estar envolvido?
Como aprendi a acreditar que acredito em alternativas, em mudanças, como aprendi a ter esperança dano-me caçar explicações, dano-me a cavucar perguntas, embrenho-me numa mata de dúvidas...e tudo que ouço novamente como respostas, de mim e dos outros, são discursos explicativos, caricaturados, transvestidos, transviados... tentativas de dar conta de uma realidade maliciosamente forjada...
O meu/nosso discurso pedagógico, a meu ver, mantém-se suspenso e vez por outra toca o chão do dito real. Os moleques e molecas continuam perdendo os dentes, perdendo a vez, perdendo a hora, perdendo as provas e provações, perdendo a atenção, a concentração, as oportunidades, os pais, os irmãos, os colegas, os vizinhos...há entre os nossos meninos e meninas, aqueles que nunca se viram e nunca se encontram num oportuno conforto de um lar, em redor de uma mesa...há aqueles que nunca encontraram uma escola que lhe conhecesse ou lhe reconhecesse...as nossas escolas têm poucos e as vezes nenhum espelho...nossas escolas não se vêem, não se reconhecem, porém conservam nos seus discursos falas desencontradas sobre quem poderiam ser...
Este escrito sobre discursos será fiel as minhas inquietações...dessa forma a única certeza que tenho nesse momento é que essa conversa terá fim provisório...

sábado, 10 de abril de 2010

ESTA É UMA PROPOSTA DE LOGO...O QUE ACHAM ???

quarta-feira, 7 de abril de 2010

ESSE QUE VEJO DIANTE DE MIM TAMBÉM SOU EU

HEITOR ROCHA GOMES

Uma questão se tornou incômoda, constante, recorrente nas minhas esparsas reflexões diárias sobre o meu fazer pedagógico: quem somos nós SERES ENSINANTES? Qual a nossa face mais constante? Como chegamos, de que maneira povoamos o PLANETA EDUCAÇÃO?

Cada momento que olho nos olhos do outro que me reflete e que eu reflito me assombro: ESSE QUE VEJO TAMBÉM SOU EU? Esse que grita, que se descabela, que se ausenta, que se omite, esse que faz das tripas coração sou eu? Essa que olha de perto, que se interroga rigor, que sabe que se perde...que raros momentos se acha quem é?

Quem é esse ou essa do PLANETA EDUCAÇÃO     que persegue,coage, instrumentaliza, trama,ameaça e teme a quem deveria conduzir,orientar,referendar,vincular, aconchegar e...finalmente educar...esse ou essa...também sou eu?

Enquanto ficamos parados repetindo como papagaios discursos moucos,ocos as várias receitas do que é e do que não é ensinar nossas juventudes estão se perdendo debaixo dos nossos narizes arrebitados.

Meu grande incômodo é saber que a vida é breve e citando Leo Jaime "Mas eu acredito que ninguém tenha vindo pro mundo a passeio", se bem que a idéia é tentadora e extremamente necessária. Mas temos tanto a fazer, temos tanto para plantar e para colher, temos tanto para VISLUMBRAR...para sonhar,para realizar... o problema é que os sonham sonhos solidários, fraternos, políticos, proféticos ainda são poucos diante da labuta que é construir um PLANETA PASSEIO, seguro e transcendente para todos que precisam desejam passear. Me pergunto quem são esses que se ausentam dos seus lugares das suas IDENTIDADES PEDAGÓGICAS? Quem SÃO esses EUS que praticam a PEDAGOGIA DA AUSÊNCIA?

OS HABITANTES DO PLANETA EDUCAÇÃO SOFREM DO MAL DO AUTO-DESCONHECIMENTO... nos espelhos que se olham não enxergam nada além do uma imagem fugidia, etérea, desconexa de si mesmos, dessa forma como não se conhecem não podem se reconhecer...se não se reconhecem não se encontram...acho que era isso que eu precisava dizer.